DIÁRIO DE PIERRE: A HISTÓRIA DE UM CAMPONÊS


Tempo de leitura: 6 minutos

Oi turma!!

Tudo legal?

Pois.. Por aqui tudo. Creio que as vezes, ainda mais na situação atual,
(violência, desemprego, miséria, corrupção entre os que deveriam
governar em beneficio do povo e, ao invés disso, governam no de si
próprios ou das classes mais altas), a gente se pergunta: E onde estão
os “grandes revolucionários”? Onde estão aqueles que, realmente, são
capazes de “mudar o mundo”? Pois, o texto que trago hoje mostra um pouco
isso, além de contar, de uma forma incrivelmente cativante, parte da
história da revolução francesa. De minha parte, deixo pra dizer o que
penso disso tudo quando vierem os comentários, se bem que já posso dar
uma palhinha dizendo o seguinte: “Eu, do contrário, nunca desistiria”…

Vamos ao texto então:

DIÁRIO DE PIERRE: A HISTÓRIA DE UM CAMPONÊS

Rosani Martins

Lembro-me como se fosse hoje, tantos anos já se passaram e as
lembranças não se apagam. Em pensar que fiz parte de um sonho que, em
minha visão não chegou à realidade, embora não possa negar que os feitos
daquela revolução acabaram por transformar a História.

Naquele contexto, eu era um simples camponês que, como todo o
chamado Terceiro Estado era explorado pelo clero e pela nobreza
francesa, o Primeiro e o Segundo Estado respectivamente. Éramos nós
camponeses e a ascendente burguesia que trabalhávamos e pagávamos
impostos, o que garantia a riqueza e a mordomia dos dois outros grupos.

A França, em plenos efeitos da chamada Revolução Industrial, ainda era
um país que adotava velhas práticas feudais e era dependente do setor
agrário. Politicamente, o Absolutismo francês tentava sobreviver ao
avanço das idéias liberais e ao bombardeio dos chamados filósofos
iluministas.
O Cenário era de insatisfação e nós do Terceiro Estado, maioria
da população francesa, queríamos sair da condição de explorados e também
contribuir para que a França acompanhasse as novas transformações. A
burguesia, detentora de capitais, ainda queria mais: queria dinheiro e
poder político, o que tornava o rei absoluto um terrível obstáculo. As
idéias iluministas foram os ingredientes da revolução e a consciência da
condição de explorados movia o povo e a burguesia. Assim, o povo, no
qual me incluo, foi o corpo da revolução, o braço forte que foi à luta,
enquanto a burguesia foi a cabeça, ou seja, a mentora da Revolução
Francesa.

A burguesia sugeriu que todos pagassem impostos, o que, é obvio,
não foi aceito pelos grupos dominantes. Com isso, iniciou-se o choque de
classes que culminou com a “Tomada da Bastilha” em 14 de julho 1789. O
local onde os presos políticos eram punidos se transformou em centro da
resistência. Eu contava apenas dezenove anos, entendia pouco de
política e de poder, mas sabia o que era ser explorado e viver sem o
mínimo de dignidade. Por isso lutei, peguei em armas e, acho, que até
matei. Eu tinha um sonho, queria ajudar os camponeses, a classe da qual
fazia parte, muito embora não soubesse disso com a clareza e consciência
que tenho hoje.

A primeira grande conquista do movimento foi a Monarquia
Constitucional, a qual limitava os poderes do Rei. Depois veio a
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, o que pode ser entendido
como a concretização do lema: “Igualdade, Fraternidade e Liberdade”. A
burguesia tomou terras do clero e da nobreza e começou a apoderar-se da
política e da economia francesa. O Rei traiu o movimento buscando ajuda
externa para resistir e pagou com a vida, sendo decapitado. A partir
daí, a resistência francesa teve de endurecer cada vez mais,
radicalizando o movimento. Uma ameaça de invasão externa fez com que os
Jacobinos tomassem o poder e lá estava eu novamente, ao lado de Danton,
Robespierree e tantos outros, lutando por uma França mais justa e
igualitária.

O período jacobino foi a fase mais radical do conflito, o povo
estava no poder e se valia do que mais conhecia para não ser derrotado,
isto é, da força. O saldo de mortos foi mesmo assustador e eu em meio a
tudo aquilo, comecei a desiludir-me e a questionar todo o processo. Não
queria que meu nome figurasse na História entre os chamados “cortadores
de cabeças” – era assim que os jacobinos eram chamados. Abandonei a
resistência e fugi do exército na calada de uma noite fria e, poucos
dias depois ofereci minha força de trabalho a uma tímida indústria
têxtil para sobreviver e esquecer tudo que vivera até ali.

Não demorou muito para que os Girondinos tomassem o poder
através de um golpe, tirando o povo do jogo político. A burguesia
chegava onde queria e não poderia permitir que o povo tivesse mais
força que ela. As conquistas do período Jacobino foram todas revogadas
pelos Girondinos – a alta burguesia. Foi então que cheguei à conclusão
de que a burguesia usou o povo para chegar ao poder e que se livrou dele
na primeira oportunidade que teve. Foi duro perceber que para nós, não
houve Revolução, e sim participação. Bastou a burguesia chegar ao poder
e voltamos á nossa velha condição de explorados sustentando uma nova e
poderosa classe social, a única coisa que realmente mudou.

Não posso negar que com a ascensão de Napoleão ao poder, não
houve progressos e conquistas, afinal, ele investiu na indústria, criou
o Código de Leis, fundou a escola técnica francesa para qualificar
profissionais e revolucionou a educação; eu mesmo fui beneficiado,
estudei bastante para tentar entender mais todo aquele processo do qual
participei e que por muitas vezes me fugia à capacidade de compreensão.

Todavia, para mim, a grande obra de Napoleão foi despertar nos franceses
o censo de Nação, o que colocava a França acima de tudo e unia os grupos
em torno da idéia: “Somos todos franceses”. Infelizmente, Napoleão não
contentou-se com o poder que exercia sobre a França e passou a impor
uma política agressiva que o fez anexar praticamente toda a Europa à
chamada Confederação do Reno. A exceção foi a Inglaterra, a qual
resistiu às investidas do imperador francês e conseguiu sobreviver ao
Bloqueio Continental imposto por ele aos países anexados. Países
europeus não obedeciam às ordens de Napoleão e continuaram a consumir
os produtos britânicos. A Era Napoleônica termina na Batalha de Waterloo
onde o líder francês foi finalmente batido após seu retorno para o
chamado governo dos cem dias.

Após o Congresso de Viena a França retomou velhas práticas
absolutistas e a burguesia foi a grande derrotada, tendo que assistir
todas as suas conquistas caírem por terra. De 1815 até hoje ela não
conseguiu recuperar seu poder político e agora convoca a nação francesa
para uma nova Revolução. Novamente quer usar o povo para voltar ao
poder e, o que é pior, acho que está conseguindo. Porém, não precisam
mais contar comigo, pois sei que quando chegarem onde querem e ao que
pretendem, novamente afastarão o povo do cenário e o recolocarão na sua
condição de explorado. Não me arrependo do que fiz, lutei pelo que
achava justo, hoje sei que fui usado, mas cheguei a pensar que tinha
contribuído para melhorar a vida dos pobres e explorados. Acho até que,
do meu jeito, ainda consigo ser feliz, apesar das frustrações. Sou
casado com Françoise, uma mulher maravilhosa, e tenho dois filhos:
Maurice e Michelle, além de três netos: Isabelle, Mellissa e Edgard.

Penso que nenhum deles tem do que se envergonhar de mim e hoje que
estou completando 60 anos de idade, lembrei-me de tudo isso. A única
conclusão que consigo chegar é a de que posso até não ter ajudado os
menos favorecidos a saírem dessa condição, mas não posso negar que
participei de um dos mais importantes processos históricos.

Paris, 14 de Julho de 1830.


E então? Ele não sabia, obviamente, que alguns anos depois também a
burguesia seria mandada, como eu digo, “pro invéérno”, mas mesmo assim,
as coisas já estavam querendo começar a se complicar e ele já havia
deixado claro que “não queria ter nada a ver com isso”… É uma pena que
isso tenha acontecido com muitos, também, na atualidade. Mas sempre
podem aparecer mais alguns… A questão é: Onde está nosso senso crítico
e nosso poder de indignação? Esses sim não podem nunca “ir pro
invvvéérno”, como eu digo…

Abaixo coloco um comentário da autora sobre a intenção dela ao criar
esse texto, vamos a ele:


“O Diário de Pierre” é um texto pensado e construído para
despertar a reflexão dos leitores sobre um grande acontecimento
histórico que marca o final do século XVIII.

Pierre é um personagem de ficção, mas faz reflexões muito
importantes acerca do referido marco. A idéia é tornar o estudo do
tema ao qual o texto pretende analisar de uma forma mais interessante e
menos formal, como ocorre nos tão criticados livros didáticos.

“Pierre” assume sua posição e incita os leitores a se posicionarem
sobre o que estão lendo. A linha adotada é a de se estudar História de
forma crítica e questionadora.

Não há como transformar a realidade sem ter, em si mesmo, a
capacidade de indignação. Por tanto, ao construir o personagem em
questão, a grande proposta do presente texto é de permitir ao leitor
pensar o tema tratado em dimensões que vão para além do texto narrativo
e, em certa medida, romanciado que conta a vida de “Pierre”.


Pois… Agora fico por aqui, e deixo os comentários com vocês.. Em breve
também apareço por aqui pra dar mais um “pitaquinho” sobre tudo isso…

Abração e até mais!

Fernando

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